Ação da OAB-DF impede pagamento de dívidas privadas com verba pública

Brasília – Os contribuintes do Distrito Federal não terão de pagar dívidas trabalhistas de empresas privadas de ônibus que somam mais de R$ 100 milhões. Foi o que decidiu, nesta terça-feira (17/12), o Tribunal de Justiça do DF, ao acolher a Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada em 14 de novembro pela OAB/DF. A Seccional contestou na Justiça a lei que transferia para os contribuintes o pagamento de dívidas de empresas privadas. Os desembargadores do TJ/DF julgaram, em conjunto, as ações da OAB e do Ministério Público contra a Lei 5.209/2013. O presidente da Seccional do DF, Ibaneis Rocha, classificou o resultado do julgamento como uma vitória da sociedade e afirmou que um dos papéis institucionais da OAB é o de zelar pela legalidade. “Não é razoável que o contribuinte do Distrito Federal arque com a dívida de empresas que prestaram durante mais de 40 anos serviço de transporte público de péssima qualidade, com ônibus velhos e mal conservados e com tarifas elevadas”, sustentou a OAB/DF na ação, assinada pelo presidente da entidade. De acordo com Ibaneis, o Tribunal reconheceu que “a lei fere diversos artigos, tanto da Lei Orgânica do Distrito Federal, quanto da Constituição Federal”. Em seu voto, a relatora do processo, desembargadora Vera Lúcia Andrighi, fez referência a iniciativa da OAB/DF, salientando que o tribunal não é contrário ao recebimento dos direitos trabalhistas, mas é sua tarefa analisar as leis do ponto de vista legal. “Quando o tribunal, eventualmente, reconhece o defeito na norma e por esse motivo a norma não é aplicada, não é o Judiciário que está tirando o direito dos rodoviários”, explicou. Segundo ela, a responsabilidade é da Câmara Legislativa e do governo. A desembargadora disse ainda que a Lei 5209, ao atribuir responsabilidade contratual ao Estado, fere a Lei Orgânica do Distrito Federal. “A Lei Orgânica não autoriza o Estado a assumir dívidas de qualquer natureza, de qualquer prestadora de serviço público. Isso seria o caos financeiro do Estado, empresa alguma se preocuparia em cumprir suas obrigações. A responsabilidade contratual se restringe às empresas permissionárias ou concessionárias e seus contratados”. A OAB/DF reconhece que os trabalhadores têm o pleno direito de receber seus créditos trabalhistas. Mas há alternativas para que não fiquem sem receber. Entre elas, a rescisão indireta dos contratos de trabalho para absorção dos rodoviários pelas novas empresas, acordos coletivos a serem firmados na Justiça do Trabalho e até mesmo o ajuizamento individual de reclamações trabalhistas. A presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais da OAB/DF, Christiane Pantoja, também reiterou que o Tribunal de Justiça agiu corretamente. “É impossível que o poder concedente arque com as recisões trabalhistas. Isso é inconstitucional, viola lei das licitações, viola o acordão do Supremo Tribunal Federal e também as disposições do próprio Tribunal Superior do Trabalho. Espero que isso não gere uma descontinuidade do serviço, pelo contrário, a lei prevê que as novas empresas são obrigadas a dar preferência aos antigos empregados. Se continua com a empregabilidade e se discute posteriormente a questão da rescisão trabalhista”. afirmou. Atividade empresarial unnamed (43)“O que não se pode admitir é que grandes empresários — sócios majoritários das empresas devedoras dos encargos trabalhistas, alguns conhecidos desde o tempo em que operavam companhias aéreas — sejam beneficiados com a exclusão do risco da atividade empresarial. Risco esse que era extremamente previsível diante do processo licitatório e que não pode ser assumido pelo Estado, à custa de recursos de serviços igualmente essenciais, se olharmos, por exemplo, para a situação precária da saúde e da educação aqui no Distrito Federal”, alegou a Seccional na ação acolhida pelo Tribunal. A ação foi proposta contra a Lei 5.209/2013, sancionada pelo governador Agnelo Queiroz e vigente desde o dia 30 de outubro passado. Pela norma, se as empresas de transporte público que deixam de prestar serviços não quitassem as dívidas trabalhistas com seus empregados, o governo deveria quitá-las. Ou seja, a lei fazia o contribuinte assumir todas as despesas decorrentes da rescisão do contrato de trabalho de empregados de empresas privadas. A OAB/DF contestou o argumento de que o governo, depois de pagar as dívidas, cobraria os valores das empresas: “O governo do Distrito Federal não tem garantias de que o dinheiro será restituído aos cofres públicos. O Executivo queria pagar a dívida para, depois, ir atrás de um patrimônio que sabe ser incerto. E sobraria para o contribuinte do Distrito Federal arcar com esses valores”. A iniciativa do governo do Distrito Federal poderia ser resumida no seguinte, conforme a ação ajuizada pela Ordem: “Apesar de as empresas disporem de patrimônio, o governo, sob o pretexto de garantir a continuidade dos serviços de transporte público, por livre disposição, firma instrumento ilegal isentando as novas concessionárias da sucessão, garantindo a estabilidade de empregados antigos, e, pasme-se, assume o passivo trabalhista de todas as empresas devedoras”. Com o julgamento desta terça-feira, o Tribunal de Justiça do DF tira dos ombros do contribuinte o pagamento de uma dívida milionária que não é sua. Fonte: Imprensa OAB-DF

Correio Braziliense: O STF e o financiamento de campanha

Brasília - O jornal "Correio Braziliense" publicou nesta quarta-feira (18) artigo de Aldo Arantes, secretário da Comissão Especial de Mobilização para a Reforma Política da OAB. Leia abaixo a íntegra do artigo. O STF e o financiamento de campanha por Aldo Arantes Os quatro votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a favor da declaração de inconstitucionalidade do financiamento de campanha por empresas, proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), desencadeou forte reação dos setores conservadores e da grande mídia. Surgiram argumentos contra inclusive o de que se trata de uma manobra da OAB e do PT para este se manter no poder. Mas não há nenhum argumento defendendo a constitucionalidade dessa forma de financiamento. E é da inconstitucionalidade que trata a ação da OAB, não de reforma política. É, portanto, matéria de competência do STF. A OAB fundamentou sua Ação Direta de Inconstitucionalidade no argumento de que a Constituição brasileira estabelece, no artigo 1º, que o “poder emana do povo”. Não sendo povo, a empresa não pode financiar o processo político, porque isso conduz uma disputa altamente desigual entre os que têm muitos recursos e os que não têm. Tal fato adultera a vontade da maioria, o exercício da soberania popular. A influência do financiamento de empregas nas eleições acarreta profunda desigualdade na disputa eleitoral. Ganha as opções, no geral, quem tem mais dinheiro. Influência do capital no processo eleitoral fica evidenciada diante do fato de que o aumento brutal dos custos de campanha é acompanhado de igual crescimento do financiamento por empresas. O financiamento de campanhas cresceu assustadoramente: de R$ 827 milhões em 2002 para R$ 4,9 bilhões em 2010. E o financiamento por empresas, que em 2008 representou 86% do total, em 2012 representou 95,1%. Isso porque a legislação permite que empresas contribuam com 2% dos seus rendimentos brutos no ano anterior à eleição. Assim, o Grupo Odebrecht poderia contribuir com R$ 1 bilhão e 688 milhões em 2013, já que obteve rendimentos brutos de R$ 84,431 bilhões em 2012. A OAB questionou, também, a desigualdade na disputa eleitoral produzida pelo financiamento de pessoas físicas, pois a lei permite doações de 10% dos rendimentos brutos auferidos no ano anterior ao da eleição. Assim, o banqueiro Jorge Lemann, que em 2013 teve um rendimento de R$ 13 bilhões e 336 milhões, poderá contribuir com R$ 1 bilhão e 336 milhões, gerando profunda desigualdade na disputa eleitoral. O financiamento de empresas resulta em que a maioria da sociedade, composta de trabalhadores e classe média, é transformada em minoria no Congresso. Tal fato é uma evidente subversão da democracia e do conceito de que o poder emana do povo. A proibição do financiamento de empresas não é uma criação da OAB e dos movimentos sociais. Existem em mais de 36 países, como Canadá, México, Bélgica, Grécia, Israel, França e diversos outros. A crítica de que a iniciativa tem por objetivo a manutenção do PT no poder é isenta de seriedade, pura demagogia para confundir a opinião pública. A iniciativa da ADI é da OAB. Ela e 60 outras entidades sociais se uniram na Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, em torno de um projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados. Compõem a Coalizão a OAB, a CNBB, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), a Plataforma pela Reforma Política dos Movimentos Sociais, a UNE, a CUT, a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), a União de Vereadores do Brasil (UVB), a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic), além de outras 50 entidades das mais representativas da sociedade brasileira. O projeto da Coalizão proíbe o financiamento de campanha por empresas. Propõe o financiamento democrático de campanha, as eleições proporcionais em dois turnos, a paridade de gênero nas listas partidárias e o fortalecimento de mecanismos da democracia direta, tais como plebiscito, referendo e projeto de iniciativa popular. O financiamento democrático inclui o financiamento público e o financiamento de pessoas físicas, limitado a R$ 700, não podendo esta última ultrapassar 40% da contribuição pública. A eleição proporcional em dois turnos fortalece os partidos políticos e a política feita em torno de ideias, mas reserva aos eleitores, no segundo turno, a última palavra na escolha dos candidatos. Essa alternativa reduz bastante o custo das campanhas e permite uma maior fiscalização do processo eleitoral. O fato é que a tendência do STF de aprovar a inconstitucionalidade do financiamento de empresas coloca a reforma política no centro dos debates do próximo ano e durante as eleições. Abre, assim, o caminho para transformar o projeto da Coalizão no grande escoadouro da sociedade brasileira em torno de uma reforma política democrática.